Eduardo Spohr: um autor no Paraíso Perdido

Depois de passar um ano e meio imerso no processo de criação de Paraíso Perdido – seu quarto romance e terceiro da série Filhos do Éden -, Eduardo Spohr diz nesta entrevista que escrever é angustiante: “É aquela incerteza se vamos conseguir escrever determinada cena ou não.” Isso pode parecer estranho a quem imagina que as dúvidas costumam desaparecer à medida que o autor ganha experiência, então Eduardo completa: “Mas também não deixa de ser divertido. Os desafios difíceis são sempre os mais estimulantes.”

Paraíso Perdido fecha a trilogia iniciada em 2011 com Herdeiros de Atlântida e seguida por Anjos da Morte, além de abrir caminho para os eventos de A Batalha do Apocalipse – primeiro livro do autor mas que sucede temporalmente a série Filhos do Éden. O lançamento será no dia 31 de outubro, em local ainda a ser definido. Os fãs terão oportunidade de encontrar o autor na XVII Bienal do Livro do Rio, no dia 6 de setembro, às 14 horas (auditório Lapa, Pavilhão 4 – verde), conversando sobre o novo livro (que ainda não estará disponível para venda) e autografando os anteriores. Haverá também leitura inédita de trechos de Paraíso Perdido.

Conheça abaixo algumas ideias de Eduardo Spohr sobre criação literária na entrevista que o escritor deu ao Conexão Autor

Quem lhe acompanha conhece sua trajetória na literatura: você venceu um concurso de uma gráfica, que lhe rendeu a publicação de cem exemplares de A Batalha do Apocalipse. Esses exemplares foram vendidos na Nerdstore e posteriormente você mandou imprimir mais quatro mil exemplares, que se esgotaram rapidamente. Só depois disso você foi contratado pela Record, uma das grandes editoras nacionais. Muitos autores inéditos ainda resistem à ideia de começarem pela autopublicação – ou, com as facilidades tecnológicas atuais, pela publicação digital. Como você vê essas formas alternativas de publicação para um escritor que sonha com uma publicação tradicional, lançada por uma editora comercial?

Eduardo Spohr: Olha, eu acho que não existem duas trajetórias diferentes. Fala-se muito em internet, autopublicação, e claro que são todas alternativas válidas, mas não as únicas. O importante, acho, é que o autor siga a trilha que ele mais se sinta confortável. Eu tenho uma formação jornalística no meio digital e já tinha vivência em blogs e redes sociais. Então para mim tudo isso foi meio que natural. O que não pode acontecer é o autor não correr atrás. É preciso, sim, além de se empenhar na obra, empenhar-se na divulgação – isto é, levando em conta que ele quer (ou tem a pretensão de) ser lido.

Você já disse que o fato de ter viajado pelo mundo conhecendo países e culturas diferentes –  graças ao fato de seu pai ser piloto de aviões e sua mãe ser comissária de bordo – estimulou seu gosto pela história. Umberto Eco disse que é importante visitar os lugares sobre os quais se pretende escrever. Na sua opinião, dá para escrever uma história crível sem nunca ter estado no local onde ela é ambientada?

Eduardo Spohr: Certamente é possível, mas requer um esforço muito grande. Nunca teremos como saber como era a vida (exatamente) na Roma Antiga, por exemplo, então a gente tenta montar o quebra-cabeças. Todavia, essa pesquisa in loco é não só importante, mas prazerosa para qualquer escritor (imagino). Me lembro que em A Batalha do Apocalipse escrevi sobre a Jerusalém moderna sem ter estado lá. Acho q ficou legal, mas ganharia muito se eu pudesse ter visitado a cidade.

Paraíso Perdido, de Eduardo Spohr
Capa do novo livro de Eduardo Spohr

 

Seus livros são repletos de fatos e dados históricos, justamente devido ao seu gosto pela matéria. Quanto do tempo total de produção de uma obra você dedica à pesquisa e quanto à escrita propriamente dita? Você tem um método de pesquisa que utiliza para todos os livros ou cada um exige um planejamento diferente?

Eduardo Spohr: Depende muito. De qualquer maneira, no meu caso esse tempo de pesquisa é menor do que as pessoas pensam porque eu até agora só escrevi sobre períodos históricos que eu gostava e que eu já conhecia. Ou seja, eu já venho estudando sobre eles faz anos. No entanto, é SEMPRE necessária uma pesquisa pontual.

Aliás, você já falou diversas vezes em como planeja suas histórias. Qual a diferença entre um livro que foi planejado detalhadamente e um que foi escrito sem qualquer planejamento, apenas seguindo o fluxo narrativo do autor (que nem sempre sabe onde isso vai dar)? Isso ajuda a determinar se será um livro bem escrito?

Eduardo Spohr: Nunca escrevi um livro sem planejamento, então não teria como julgar essa experiência. Mas não acho que isso determine a qualidade do texto, até porque sempre vai haver revisões etc. Talvez possa influenciar nos rumos da história, isso acho que pode acontecer mesmo. Reza a lenda que o Cornwell escreveu a trilogia do Artur assim, sem planejamento. E ironicamente acho a melhor série dele.

A guerra é um de seus temas preferidos, conforme você mesmo já declarou. O que há nela que faz com que seja um assunto tão propícia à literatura, já que temos outros inúmeros exemplos de autores que a utilizam como pano de fundo para suas histórias?

Eduardo Spohr: A guerra nos é fascinante porque é em situações de risco onde o ser humano é levado aos seus limites, e mostra sua verdadeira natureza, para o bem e para o mal. E eu acho que uma das funções da arte é explorar esses meandros da natureza humana.

Há uma corrente de autores que defende que a escrita vem do sofrimento. Que o processo de criação é doloroso. Como é o seu processo criativo? Ao lermos seus livros temos a impressão de que você se diverte escrevendo. Isso é verdade?

Eduardo Spohr: Não acho que a escrita vem do sofrimento, acho que o sofrimento (a superação dele, melhor dizendo) nos faz crescer, e isso pode ajudar no amadurecimento da escrita, talvez. Quanto ao processo de escrita em si, ao dia a dia, eu não chamaria de doloroso, chamaria de angustiante. É aquela incerteza se vamos conseguir escrever determinada cena ou não. Mas também não deixa de ser divertido. Os desafios difíceis são sempre os mais estimulantes.

Em sua carreira pré-literatura, você trabalhou com publicidade e depois enveredou pelo jornalismo. Há vários trabalhos que tentam relacionar o ofício de jornalista com o ofício de escritor, mostrando como, para alguns, são complementares, enquanto para outros são excludentes (para esses, a prática jornalista contaminaria a criação literária). Um bom exemplo é o livro Pena de Aluguel: escritores jornalistas no Brasil 1904-2004, de Cristiane Costa, cuja pesquisa partiu da questão: o jornalismo ajuda ou atrapalha a atividade literária no Brasil? Como você responderia a essa pergunta? A sua experiência com o jornalismo ajudou a sua literatura ou suas influências são mais cinematográficas e de RPG?

Eduardo Spohr: No meu caso ajudou muito, pois o jornalismo me deu uma intimidade com o texto. Os prazos eram “para daqui a dez minutos” então eu não podia ficar enrolado. Tinha que sentar e escrever. E é isso o que faço até hoje.

Você declarou em um Nerdcast que foi criticado por seus diálogos no primeiro livro e que, por causa disso, estudou mais a respeito para aprimorar-se. Há quem diga que diálogos são para o cinema, que muito diálogo em um livro acaba por empobrecê-lo. Na sua opinião, qual a importância dos diálogos em uma obra literária? Eles fazem a diferença ou podem ser absorvidos pela voz do narrador?

Eduardo Spohr: Eu fico um pouco com um pé atrás com essas “regras” literárias. A literatura é essencialmente anárquica, então cada um tem o seu método. Se o diálogo conseguiu passar a ideia, ótimo. Se o autor fez isso apenas com o texto do narrador, sem problemas. De minha parte, acho que os diálogos tendem a trazer mais vida aos personagens. Em um romance, acho que acrescenta muito. Mas é aquela coisa: sem regras. Cada caso é um caso.

Alguns escritores famosos dentro um gênero literário decidiram enveredar por outros gêneros sob pseudônimo, a fim de não terem seu nome vinculado às novas obras. É caso, por exemplo, de Agatha Christie – que assinou seis romances de época com o nome de Mary Westmacott -, Nelson Rodrigues – que usou o pseudônimo feminino Suzana Flag para escrever textos melodramáticos – e, mais recentemente, de J. K. Rowling – que escreveu um romance policial assinando como Robert Galbraith. Você se imagina escrevendo outros gêneros literários que não Fantasia? Se sim, usaria pseudônimo?

Eduardo Spohr: Nunca pensei sobre isso (ainda). Sou muito concentrado no momento. Hoje estou terminando meu quarto romance e tenho vontade de escrever sobre muitas outras coisas, mas pensarei nisso quando chegar a hora. De qualquer modo, eu acho que flertei com muitos gêneros ao longo desses quatro livros. Anjos da Morte por exemplo, eu gosto de pensar que é mais um drama psicológico do que um livro de ação.

O cenário de literatura Fantástica no Brasil tem crescido muito, tanto com o investimento em autores nacionais quanto com a publicação de autores estrangeiros e o estabelecimento de novas editoras especializadas no gênero. Você acredita que esse ainda é um bom nicho para investir ou o mercado está ficando saturado e é melhor tentar outro gênero? Nesse caso, em que gênero você apostaria?

Eduardo Spohr: Não acho que um autor deva pensar se é um bom ou mau negócio. Ele deve escrever o que está em seu coração, caso contrário a obra estará fadada ao eterno fracasso, pois será algo falso e artificial. Pelo menos, é assim que eu trabalho. Escrevo o que quero escrever, o que é verdadeiro para mim, e tanto fazê-lo da melhor forma possível.

O autor escreve no blog Filosofia Nerd e pode ser encontrado também no Facebook, Twitter, Google+ e Instagram.

*Arte da capa sobre foto de Paula Johas

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Sobre o Autor

Ronize Aline
Ronize Aline

Ronize Aline é escritora e consultora literária. Já foi crítica literária do jornal O Globo, do Rio de Janeiro, e trabalhou como preparadora de originais para várias editoras nacionais. Atualmente orienta escritores a desenvolverem suas habilidades criativas e criarem histórias com potencial de publicação.

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