A coceira incômoda da adolescência

Adolescência vem do verbo latim adolescere, que significa crescer. Em muitas culturas, o vislumbre da vida adulta é comemorado por cerimônias e rituais, enquanto o próprio adolescente nem sempre vê muitos motivos para comemorar. O que ele sente se assemelharia mais a uma coceira incômoda que começa pequena e vai se avolumando, até não caber mais dentro do corpo, até então, de criança.

Mari, a protagonista de A menina e a planta, de Marcia Paganini (texto) e Andréia Vieira (ilustrações), é uma adolescente. Tão igual aos demais adolescentes na capacidade de serem únicos. Tão singular em sentir a mesma coceira da adolescência que chega um dia sem avisar, atropelando quereres até então definitivos. E Mari sente, literalmente, essa coceira se impor às suas vontades.

Tudo começa com uma coceirinha persistente em cima do pé, que se agiganta e se transforma em uma planta que vai crescendo sem parar, o que a joga em um mundo de angústia – causada pelo sufocamento que a planta provoca – e medo da descrença alheia – causado pelo inusitado da situação. A partir daí, uma enxurrada de sensações e emoções a inundam: “Era muito pesado carregar aquele troço no corpo! Às vezes Mari ficava realmente triste. Não sabia exatamente por quê. A tristeza chegava como uma visita inesperada, permanecia um tempo e, de repente, ia embora sem sequer dizer tchau.”

Arrancar a planta incômoda é o primeiro impulso de Mari para resolver aquela situação, como se fosse possível extirpar a adolescência e parar o crescimento tão doloroso. E, quanto mais inusitada e incômoda a sua situação, mais sozinha Mari se sente. Afinal, quem seria capaz de entender o seu sofrimento? Marcia Paganini vai construindo com muita sensibilidade uma personagem que poderia cair no caricato, não fosse a delicadeza com que esboça os sentimentos mais íntimos de Mari. Ao mesmo tempo em que não se furta de trazer à tona tais sentimentos, a autora cuida de dar-lhes relevância e tratar-lhes com respeito.

A mãe de Mari merece, também, destaque. Com uma personalidade pertinente à sua condição de mãe mas sem perder de vista a ternura e a capacidade de se sensibilizar com o momento vivido pela filha, ela é a bússola que ajuda Mari a escapar do nevoeiro em que a garota se encontra. “E, de folhinha em folhinha arrancada, de brotinho em brotinho podado, a trepadeira ficou quase invisível. Praticamente extinta. A menina foi descobrindo como lidar com a planta que dormia nela.”

Ao lado do texto firme e pungente de Marcia estão as ilustrações envolventes de Andréia. Feitas com grafite sobre papel, elas revelam uma combinação perfeita de luz e sombra que traduzem com maestria os sentimentos de Mari. São ilustrações que aprofundam a história e nos permitem “sentir” a tormenta que se apossa da protagonista. Essa é uma daquelas histórias que merecem ser lidas por crianças, adolescentes, mães, pais e familiares de adolescentes e todos os que já passaram por esse momento e sentiram na própria pele a conceira incômoda do crescimento.

A menina e a planta

Marcia Paganini

Ilustrações de Andréia Vieira

Madrepérola, 2019

36 páginas

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Sobre o Autor

Ronize Aline
Ronize Aline

Ronize Aline é escritora e consultora literária. Já foi crítica literária do jornal O Globo, do Rio de Janeiro, e trabalhou como preparadora de originais para várias editoras nacionais. Atualmente orienta escritores a desenvolverem suas habilidades criativas e criarem histórias com potencial de publicação.

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